Sofia pousava o livro d' "A Fada Oriana", conto de Sophia de Mello Breyner, que claro, adaptava para a filha, pois ela ainda pouco sabia ler, pois a infância de Oriana tinha sido passada de maneira diferente de todas as outras crianças. E amanhã voltava a mais um dia desses, que não tinha viagens para a escola, sandwiches feitas pela mãe nem as conversas com os colegas da turma.
As coisas mais aproximadas que tinha eram as auxiliares que tentavam ajudar as crianças a aprender e os livros e brincadeiras que por lá havia. Era duro, e trocava de lugar com a filha se assim se pudesse...
As portas do Hospital Pediátrico abriram-se e a "fada" Oriana entrou pelo seu pé sorrindo como se o mundo fosse o lugar mais belo para ela e agarrando a mão da sua mãe com força. O pai depositava um beijo na testa de Oriana e deixava transparecer um ar sereno, embora já estivesse preparado para ouvir o diagnóstico.
Oriana correu assim que viu a Dr. Hélia e abraçou-se muito a ela. A médica de 33 anos estava ali pronta novamente para receber a criança que já tinha sido sua paciente há 3 meses. E como gostava do cabelo dourado de Oriana! Era de facto uma criança bonita, com feições da mãe, mas os seus olhos eram nitidamente do pai. Sorriu e disse-lhe:
- Como está a minha "fada"?
Sofia e Mário sorriram. A filha estava feliz apesar de tudo e isso era importante.
Levaram-na depois para o pequeno parque onde os meninos brincavam. Eram sobretudo meninos doentes com vários casos de doenças complicadas, mas maior parte deles ia ser curado em pouco tempo. O mesmo talvez não se pudesse dizer de Oriana...
O consultório estava mais frio do que o resto do edifício, ou talvez fosse um frio psicológico que invadia cada centímetro dos seus corpos. A notícia era já esperada há 2 anos entre "rusgas" do Hospital Pediátrico para o IPO e internamentos de várias semanas. O diagnóstico estava lançado...
- Como sabem, a vossa filha não está na melhor situação... e a verdade é que não arranjámos dador compatível. Sabemos que a vossa filha vai começar a enfraquecer e vai ter de se manter por aqui.
Frio.
- Mas doutora, o que podemos fazer nós... alguma coisa... no estrangeiro...
- Eu sei que é dificil de aceitar, mas não há muito que possam fazer pela Oriana... Sei que tu és católica Sofia, portanto rezem e tentem fazê-la feliz. Sempre retarda um pouco a doença e podemos encontrar um dador em qualquer parte...
- Custa-nos tanto...
- Eu sei. E a mim também. Ver uma menina como a Oriana assim... sempre tão alegre e com uma doença tão grave.. Mas estaremos sempre atentos à procura de um dador. E fazer os possíveis pela vossa filha...
- Nós sabemos doutora. Obrigado por tudo...
E aparecia agora a porta Oriana com o sorriso enorme e com o ar irrequieto:
- Papá e Mamã, vamos brincar?
Leucemia.
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