Era aquele stress saudável para uns, tenebroso para outros, que assim enfrentávamos a recta final de mais um ano, cheio de histórias e aventuras, encantos e desencantos. O Verão aproximava-se a passos largos, e com ele o trabalho dos part-time, os chinelos pendurados nos dedos, as braçadas nas piscinas, os copos com os amigos, as alegrias de um tempo quente. E do futuro, esse ninguém queria pensar.
A Rapariga dos cabelos castanhos desfilava, por isso, nas aulas da faculdade, tentando tirar o máximo proveito dos últimos exames e frequências que a esperavam. Não era uma aluna brilhante, se querem que vos diga, mas a inteligência nunca reflectiu as notas da escola, nem a bondade se compra com vintes na pauta. E digo-vos também, as imperfeições dela eram as coisas que mais gostava, porque me desafiavam.
Sim, talvez eu estivesse mais confiante ao lado daquela rapariga, e tivesse maior conhecimento de mim próprio. Eu era de longe um exemplo para alguém, e como hoje acho não que sou. Nem sempre era cuidado, muitas vezes desmazelado e isso não ajudava muito à minha imagem. Mas queria pelo menos ser autêntico, mais confiante.
Às vezes conversávamos sobre o futuro, e tentávamos ignorar por instantes o passado convulsivo da rapariga dos cabelos castanhos. Os planos de felicidade que traçavam os olhos daquela menina, faziam as minhas órbitas rodopiar e despertar pensamentos felizes.
Era dificil não pensar num futuro com ela, mas a insegurança também estava nos planos dos dia. A bola de cristal não era clara, pois as nossas vidas não eram estáveis. Quando se perde um pai, a nossa vida não faz grande sentido, e por isso a rapariga dos cabelos castanhos queria estar comigo para compensar essa dor, muitas vezes. Não que ela me usasse, mas sabia que precisava de redobrar a atenção.
E a fase crítica ia chegar. Várias vezes iríamos estar com pouco contacto entre nós, preocupados com o trabalho que nos esperava e sem grandes perspectivas de encontro.
Para mim era doloroso deixá-la e por isso o Verão, tinha passado a ser altura que mais queria passar no ano, porque sabia que depois daqueles meses, iria encontrar os braços dela, as lágrimas e os sorrisos daquela rapariga, com a certeza da sorte que tinha tido.
Antes do último exame, o recurso que ainda tinha por fazer, a Rapariga dos cabelos castanhos sentou-se comigo na varanda de casa.
- Amanhã vai correr tudo bem.
E sorriu. Eu ficava parado muitas vezes, e ela perguntava-me naquele jeito terno, o que eu tinha, mas na verdade eu apenas estava a vaguear no pensamento, a pensar na sorte que ela se apresentava ao pé de mim, ao aceitar-me com os meus defeitos, mesmo que aquilo pudesse durar apenas um instante. Independentemente de todas as lágrimas.
- Eu sei que vai...
Um olhar mais triste apresentou-se no seu rosto.
- Então pequenina?
- Vou ter saudades tuas...
Abracei-a. Não eram preciso palavras para momentos como aquele. Apenas atitudes.
- Eu também. Mas talvez nos encontremos por aí.
- Vai ser difícil...
- Sim, mas não vale a pena ficares assim. O futuro vai acabar por sorrir, dentro de pouco tempo, e se não nos virmos, pelo menos no início do próximo ano vamos ter essa oportunidade.
E sorri.
- Sabes uma coisa?
- Diz - respondi.
- Vi-te no meu futuro.
E sorriu, como se o futuro dependesse da forma como a mão dela apertava a minha numa noite de luar em pleno Junho.
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