terça-feira, fevereiro 05, 2013

Voo 505


21h (GMT+2/Em Lisboa:19h), Ben Gurion International Airport, Tel-Aviv, Israel


São mais duas horas em Tel-Aviv, e a noite entrava pela varanda do Aeroporto Internacional como que um imenso mar de escuridão. As luzes estavam acesas mas eu sentia-me sozinho no meio da penumbra.
O voo tinha sido confortável apesar de longo, e ainda faltavam cerca de 3 horas para chegar ao Dubai. E uma delas seria passado ali, na zona internacional, à espera de descolar para os Emirados. O avião era o mesmo, mas por questões de segurança e de encomendas transportadas no avião, era obrigatória a paragem em terras israelitas.
Não era um país que admirasse conhecer. Jerusalém, sim, fascinava-me, mas o resto de Israel parecia-me vulgar, cheio de caos e instabilidade política na questão palestiniana.
É claro que esta hora em Tel-Aviv serve só para eu introduzir o texto, porque acaba por ser uma hora em que praticamente não se passou nada e que me entretive a falar com um português que também ia para o Dubai por razões de trabalho. A vida não estava fácil em Portugal...

Dubai, Aeroporto Internacional, Emirados Arabes Unidos, 2h (GMT+4 Dubai)

Saí do avião com as pálpebras ligeiramente fechadas. O dia tinha sido intenso e apesar de saber que o fuso horário era diferente sentia-me pesado. O Hotel Al Manzil esperava por mim, segundo indicações do Gabriel, ao qual acabava de me telefonar depois de terem ido jantar ao centro de Praga. E eu ali!
As ruas do Dubai eram diferentes e sabia que aquela parte era a zona turística e habitacional mais cara e por isso mais vistosa. Havia muito brilho, mas também sabia que escondia muita pobreza.
O Hotel Al Manzil surgiu então e fiquei contente, porque pelo menos parecia-me decente, e bem grande, embora no Dubai todos os prédios sejam "gigantes".
A recepcionista, fez-me então o check-in e confirmou a reserva paga pelo Gabriel.
- Porque está o quarto marcado para duas pessoas?
- Não tinhamos singles, pedimos desculpa, mas fizemos um desconto para metade, como vê.
De facto era verdade, o quarto custava o dobro do que aquilo que tinha pago em transferência o Gabriel e por isso agradeci a generosidade.
Subi então ao piso número 45, e um dos mais altos. O quarto, o 457, era por ali e certamente iria ter um quarto bom, pois o espaço dos corredores era sem dúvida fantástico.
Abri a porta e estava tudo apagado, no entanto pareceu-me ver um vulto.
Acendi a luz e uma música começou a tocar. Admito que no primeiro momento depois do susto até pensei que fosse alguma recepção do hotel, mas um bilhete pousava na mesinha de entrada do quarto.
"Nem sempre estamos bem, e o jeito para escrever sempre foi teu, por isso resumo as palavras a esta música e ao que sinto. Na verdade não quero apagar a nossa história..."
Não podia ser... O Gabriel não me podia ter feito isto...
- Sim, sou eu...
A rapariga dos cabelos castanhos abria a porta da varanda e entrava. Estava bonita admito, mas isso não me passou pela cabeça...
- Tu estás doida? O Gabriel não tinha o direito de...
- O Gabriel fez aquilo porque também é meu amigo, e sim a Sofia também me ajudou.
- Mas tu não devias estar em Moscovo com elas?!
- Não. O meu lugar é aqui. E mais vale talvez ouvires aquilo que os The Script estão a dizer para perceberes o que sinto...
- Tu...
"... six degrees of separation.
First, you think the worst is a broken heart
What's gonna kill you is the second part
And the third, Is when your world splits down the middle
And fourth, you're gonna think that you fixed yourself
Fifth, you see 'em out with someone else
And the sixth, is when you admit that you may have fucked up a little"


- Ver-te abraçado à Bárbara não foi muito fácil...
- Pois, talvez pensasses nisso antes! Mas se queres saber não tenho nada com ela. Nem quero. É só uma boa amiga...
- Ela é boa pessoa, podias ser feliz com ela.
- Não gosto dela, e não percebo porque te estou a dar justificações.
Silêncio...
- Talvez porque ainda gostes de mim.
Senti-me anestesiado pela verdade. Não podia negar, mas não podia confirmar. Teria de me manter duro e frio relativamente aquilo. "Triiiiiiiiiiiiiiiiiiiim"
- Bolas é a Sofia...
Atendi.
- Sim?
- Estou, então como estás?
- Achas bem isto? Sinceramente...
- Vai demorar?
- Ah?
- Sim, se vai demorar?
- Demorar? Só se for para apanhar o próximo voo.
- Não idiota. A perceberem que são feitos um para o outro?
Bolas.
- Eu não me posso esquecer disto só porque vocês querem. Achas que não me sinto magoado?
- Sim, mas já não estiveste do lado de lá?
- Sim...
- Então deixa de ser idiota.
Desligou.


- Desculpa.
- É dificil desculpar...
- Pois é, mas mesmo assim não custa eu tentar pedir de novo. Desculpa.
- "Love Hurts!"
- "but feel alive!"
- Canções...
- Sim, canções.

O silêncio foi império nessa madrugada. Não eu não queria desculpar, era teimoso, mas sabia que era grave, e não seria assim tão fácil. No entanto, na segunda noite, depois de me ter oferecido para dormir no sofá apercebi-me que ela estava acordada ainda às voltas na cama com os auscultadores postos.
Aproximei-me pé ante pé, e tirei os auscultadores, tapando-lhe o grito que soltou. Não queria acordar ninguém...
- O que fazes a esta hora de pé? Devias estar a dormir...
- Senti que eram horas...
- Horas?
- Sim... de mudar de faixa!

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