Passam segundos, minutos, horas, tantos dias já somados, tantos anos já passados.
O meu nome é nada, o meu tempo é vazio, porque já não conto os dias que somo. Sou eu e apenas eu. Vá, eu e a minha barba, as minhas rugas, as minhas olheiras, os meus cansaços, as pernas que já não podem, os braços que já estão cansados e este sofá. Oh velho e glorioso sofá! Quantas memórias não desfolhei aqui da guerra, dos sons aterradores que ouvi, dos aviões que me fustigavam os ouvidos... São os meus traumas e os velhos arrepios.
Divago no vazio dos dias e na televisão procuro a companhia que ja não tenho, a que já partiu e nunca mais me aconchegou o leito, nem me aqueceu a água para os pés, nem sequer a voz, suave e limpa, soou pela minha casa. Partiu.
Já não faz grande sentido existir, pois não?
A vida passa, e os sonhos, pouco a pouco, vão se desvanescendo. Há quem lhe chame desilusão com a vida, eu chamo-lhe crescer e ganhar maturidade. A palavra velho deveria ser um posto e não um estorvo na nossa sociedade.
O meu sonho sempre foi ter filhos. Tive-os é verdade. Mas para quê os ter agora, se não estão perto de mim? Se não os ouço, nem à mãe deles? São livres, e voaram do seu ninho como pássaros crescidos. A minha mulher tinha razão: para mim nunca sairam da moldura, nunca sairam de casa, do ninho onde eu com carinho os aconchegava, sorria.
Passeávamos tantas e tantas vezes aos domingos e dias santos de guarda. Umas vezes iamos até à praia, quando estava bom tempo, outras tantas visitávamos os pais da minha mulher à terra perdida no tempo. E agora, na cidade que cresce a todo o ritmo, estou eu, perdido no tempo. Perdido de quem já não conhece o bom da vida, perdido de quem não sabe o que são carinhos, afectos e beijos. Perdido.
O meu sonho é ainda um: morrer rodeado do Pedro, da Rita e do Tomás. Os meus queridos filhos. Quero sair deste mundo com a ultima memória deles. Mas a verdade é que não sei.
O que sei é que a morte virá. Tão cedo ou tão tarde. Não sei. Virá apenas, e disso não resta duvidas.
"A morte não me assusta, o que assusta é a forma de morrer" Boss Ac.
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