quinta-feira, abril 25, 2013

Um pouco de Shakespeare, tão próximo daquilo que eu penso.


Decidi publicar um texto que não é meu, mas acho que merece estar aqui. Enjoy it!

“ Aprendi que não posso exigir o amor de ninguém. Posso apenas dar boas razões para que gostem de mim e ter paciência, para que a vida faça o resto. Aprendi que não importa o quanto certas coisas sejam importantes para mim, há gente que não dá a mínima importância e eu nunca as vou conseguir convencer. Aprendi que posso passar anos a construir uma verdade e destruí-la em apenas alguns segundos. Que posso usar o meu encanto durante apenas 15 minutos, depois disso, preciso de saber do que estou a falar. Eu aprendi...Que posso fazer algo num minuto e ter que responder por isso o resto da vida. Que por mais que se corte um pão às fatias, esse pão continua a ter duas faces, e o mesmo vale para tudo o que cortamos no nosso caminho. Aprendi... Que vai demorar muito para me transformar na pessoa que quero ser, e devo ter paciência. Mas, também aprendi que posso ir além dos limites que eu próprio estabeleci. Aprendi que preciso de escolher entre controlar os meus pensamentos ou ser controlado por eles. Que os heróis são pessoas que fazem o que acham que devem fazer naquele momento, independentemente do medo que sentem. Aprendi que perdoar exige muita prática. Que há muita gente que gosta de mim, mas não consegue expressar isso. Aprendi... Que nos momentos mais difíceis, a ajuda veio justamente daquela pessoa que eu achava que iria tentar piorar as coisas. Aprendi que posso ficar furioso, tenho o direito de me irritar, mas não tenho o direito de ser cruel. Que jamais posso dizer a uma criança que os seus sonhos são impossíveis, pois seria uma tragédia para o mundo se eu conseguisse convencê-la disso. Eu aprendi que o meu melhor amigo me vai magoar de vez em quando, e que eu tenho que me acostumar a isso. Que não basta ser perdoado pelos outros, eu preciso de me perdoar primeiro. Aprendi que, não importa o quanto o meu coração está a sofrer, o mundo não vai parar por causa disso. Eu aprendi... Que as circunstâncias da minha infância são responsáveis pelo que eu sou, mas não pelas escolhas que eu faço enquanto adulto; Aprendi que numa luta preciso de escolher de que lado é que estou, mesmo quando não me quero envolver. Que, quando duas pessoas discutem, não significa que elas se odeiem; e quando duas pessoas não discutem não significa que elas se amem. Aprendi que por mais que eu queira proteger os meus filhos, eles vão se magoar e eu também. Isso faz parte da vida. Aprendi que a minha existência pode mudar para sempre, em poucas horas, por causa de gente que eu nunca vi antes. Aprendi também que diplomas na parede não me fazem mais respeitável ou mais sábio. Aprendi que as palavras de amor perdem o sentido, quando são usadas sem critério. E que amigos não são apenas para guardar no fundo do peito, mas para mostrar que são amigos. Aprendi que certas pessoas vão embora da nossa vida de qualquer maneira, mesmo que desejemos retê-las para sempre. Aprendi, afinal, que é difícil traçar uma linha entre ser gentil, não magoar as pessoas, e saber lutar pelas coisas em que acredito.”

W. Shakespeare

quinta-feira, abril 18, 2013

Review - 21 de Julho de 2011 ( mais um texto do baú, nas notas do facebook )


Faz tres anos que os nossos destinos se cruzaram num bar no centro da cidade. Era entao ela um pouco mais nova como e suposto, desfilando com os olhos, com aqueles grandes olhos, no rodilho da carpete vermelha do centro de uma pista que nao era mais que a fila de duas ou tres pessoas que tentava chegar ao balcao. Captei-a como uma Canon capta a fotografia e gravei-a nesse momento no cartao de memoria. Nao podia perder aquela rapariga.
Os 16 anos da rapariga de cabelos castanhos nao eram distinguiveis ao tacto e na primeira impressao ela pareceu-me mais velha, tirando-me algumas hipoteses de tentar falar com ela, tal rapariga convencida que nao se da com miudos.
Olhei mais um pouco com atençao e reparei que passava agora para o lado de dentro do balcao do Platinum e atendia o homem atarracado que se encontrava ao canto. Nao conhecia aquela rapariga e certamente que ja tinha passado varias vezes por aquele bar. Nao perdia nada. Dirigi-me ao balcao.
Pedi uma cola e a rapariga olhou-me desconfiada mas nao questionou. Talvez ela pensasse que um rapaz daquela idade nao pedisse colas numa noite de diversao, mas se assim pensava estava bem errada a cerca do que eu sou. E cada vez mais quis saber o que aquela rapariga dos cabelos castanhos pensava de mim e ainda mal me conhecia.
As horas passaram e eu deixei-me adormecer na cadeira e ter um sonho com a rapariga dos cabelos castanhos. Durou pouco porque logo fui acordado. Estava sozinho e apenas a rapariga se encontrava. Melhor que o sonho e mesmo a realidade, pensei.
- Hey rapaz, olha ja e tarde e o meu tio ja foi. Fiquei eu a arrumar as coisas, mas vais ter de sair.
-Anh? Simm. Ah pois... Desculpa.
A rapariga achou talvez que a desculpa era sincera e ofereceu-me uma cola para me ir embora ao qual recusei e disse que preferia antes que ela me fizesse companhia a casa. Talvez o sono me tenha levado a tal pergunta, mas agora estava feita. Ela nao se sentiu muito a vontade mas perguntou:
- Onde moras?
A Rua Carmaloggi ficava a um quarteirao e era sensivelmente perto para um curto passeio a pe. A rapariga acedeu, superando as minhas melhores expectativas. Estava ganho a primeira batalha.
O relogio na Torre Fiori marcava as 4 e 50 quando a rapariga dos cabelos castanhos fechou a porta do bar e me conduziu a casa. As perguntas fervilhavam na minha cabeça e tinha que começar por algum lado a desbravar e a clivar o diamante que tinha encontrado.
- Pois... Ah... Entao e como te chamas mesmo?
Ela respondeu-me um nome, mas que nao interessa para o caso porque para mim sera sempre a rapariga dos cabelos castanhos e nada mais faria sentido que lhe chamar isso. Respondi-lhe com o meu nome, mas ela gravou outro. Talvez mesmo o do rapaz de olhos avela, mas isso nunca saberei.
Perguntei-lhe porque trabalhava ela, que idade tinha... enfim! Todas essas coisa que se perguntam nesta situaçao. E nao foi por menos: a rapariga trabalhava porque tinha irmaos mais novos e nao tinha pai. A idade era 16 embora para mim ela parecesse mais velha que eu. Era alguem que a vida tinha pregado uma partida.
Sentamo-nos nas escadas e começamos a falar de coisa que nunca esperara falar com a rapariga dos meus sonhos: economia, finanças, musica e ate desporto. Era impressionante aquela rapariga saber tanto de tantas coisas e a mim so me deixava estarrecido. Era uma perola.
As horas passaram rapido e o frio chegou. Na despedida lembro-me apenas de um abraço que foi o suficiente para eu saber que tinha ali dois braços frageis prontos a serem amparados na mais escura das noites...
E foi assim que descobri a rapariga dos cabelos castanhos.

quarta-feira, abril 17, 2013

Textos antigos: Dar ( 14 de Setembro de 2011 )

De palavras duras é feito o mundo, não fosse este cruel e instável, como a dureza do meu nome no dominio da mesma letra eu hoje ouço e apenas partilho.
Não se trata de massajar as missangas da rapariga dos cabelos castanhos, de olhar nos olhos dela, de pegar na mão dela: o problema é um e só um: mentalidade. Os dias correm bem, outros correm mal, conclusão brilhante como só podia ser, não é? É como as palavras que eu escrevo. Agradam, não agradam... enfim.
O mundo é redondo, tem oportunidades novas aqui e além fronteiras, onde o desconhecido espreita, mas enfrento sem medo porque começo a compreender a palavra Dar. Aliás quero-me esquecer da palavra receber. Porque eu olho para o rapaz que vai descalço buscar água a um poço na Etiópia que fica a quilómetros, com o risco de ser raptado ou levar uma bala, vejo uma menina na india privada de sair, de estudar porque os pais não querem simplesmente ou porque não tem dinheiro para isso, e apenas me pergunto: sou assim tão infeliz? Não, não sou.
As coisas mudaram e o tabuleiro está do meu lado embora tu penses que está do teu. Porque eu não desmotivo, moralizo-me, não volto a cair porque nunca cheguei ao chão nem nunca, mas nunca vou esquecer, porque eu perdo-o.
Perdoar não é esquecer, é apenas apagar ligeiramente para que não se repita, e hoje eu sei mais de ti do que alguma vez poderia saber. São ilusões, puras, simples e cruas. Começo a conhecer um universo que não é aquele que conheci e hoje acordei e  pensando bem, sempre o soube. Mas o vento é forte, e os nomes que escrevi na areia já estão apagados.
As pessoas passam, mas apenas algumas permanecem. Não sei se será o caso, não sei qual é o teu caso. Mas agora sei que não conheces as pessoas, nem te sustentas na minha linha. Aliás tu não passas a linha da minha meta.
És capaz de Dar? Pois, talvez adiemos a pergunta, talvez nos devemos divertir com outras falsas histórias.
Porque eu hoje sei mais de ti.
Sei exactamente onde se encontra o peão nº5 ou onde está a torre que inicia na parte direita. A rainha essa desapareceu, e o cavalo perdeu-se no G6. Eu sei o teu jogo, sei o teu ritmo. Conheço-te com um promenor que tu não sabes, até porque se soubesses quem eu sou, jamais estarias do outro lado do tabuleiro.
Tudo isto porque precisamos de aprender a dar e a resistir a distâncias, tempos, enfim, problemas. Porque não nos queremos mentalizar do que realmente queremos. Porque a base de tudo é a mentalidade. Só e apenas isso. E a minha não sei se será evoluida, mas não será certamente a tua.
É por isso que um dia mais tarde quero partir como voluntario, conhecer outras pessoas e culturas e dar o valor aquilo que é a vida. AMI, VIDA ou ADDHU. São possibilidades.
Porque a palavra Dar é mais importante. Um dia tu vais perceber e espero que não seja tarde, porque eu já renasci, e assim assino o meu nome com a mesma letra que comecei e assim termino,
O meu nome é Daniel e quero ser feliz.
"In the End"
http://www.youtube.com/watch?v=eVTXPUF4Oz4&ob=av3e

segunda-feira, abril 15, 2013

Portugal, ainda respiras?



A diferença entre o veneno e o remédio é a dose.
Roger Stankewski
Saio à rua numa manhã de Agosto e as coisas parecem mexidas, vivas. Há uma explicação: a emigração que existe no nosso país é visível nesta época, quando regressam os que podem regressar (que parecem mais que nós!) e mostram algum do que podem exibir, alimentando a nossa economia, que com esta época do ano paga quase o resto das contas no ano que passou. Mas são cada vez menos a voltar e cada vez mais a ir embora.Portugal tornou-se num exportador enorme de jovens recém-licenciados, com qualificações altas e grandes capacidades de potencial aproveitado por outros países. O que estamos a fazer? Será que não há mesmo emprego em Portugal?A resposta pode ser dada de duas maneiras: sim ou não. Sim, não há emprego, porque efectivamente as empresas despediram e as que abriram não absorvem todos aqueles que querem trabalhar o que comprovam dados estatísticos. Não, porque se analisarmos algumas áreas podemos ver que os empregos são ocupados por pessoas que detém outros cargos na mesma área. Há várias pessoas que chegam a estar em 3 e 4 empregos ou "semi-empregos" a serem remunerados por cada um. A pergunta é: será que não poderíamos ser mais justos?Poderíamos. Mas o problema não parte do Estado, que pouco pode fazer, mas sim de quem contrata, porque querem experiência devido à instabilidade e na dificuldade em arriscar (risco zero) enquanto uma pessoa a ser inserida no mercado trabalho daria uma visão diferente (apostar para ganhar ou perder). É um problema de mentalidade, claramente.Talvez seja errado, ou talvez haja quem não concorde, mas isto é um problema de fundo na sociedade porque não conseguimos obter mudança! Enquanto não nos mentalizarmos que tudo acontece com trabalho, mentes abertas e espírito de conquista, nada será mudado.É por isso que o Remédio de cortes sucessivos deixa os portugueses à beira do descalabro social (já não atingimos?!) com um risco de pobreza de quase 3 milhões em 10 milhões e tal... Quase 30% da população vive no limiar ou perto disso. O risco é enorme, o desespero instala-se e nós continuamos a ouvir promessas de quem não corta os seus ordenados e as suas despesas. Sim! O Governo vive acima das possibilidades do país, porque há coisas ainda a fazer e o exemplo deve vir de cima...E que alternativas? Precisamos de pensar o que deve ser aposta do país. Há tantas coisa que podíamos gerir de forma sustentável. Portugal tem recurso altamente rentáveis para o país, como o recurso marítimo, o fluvial, o geológico. Temos tantas possibilidades e aproveitamos tão pouco. Não precisamos de mais cortes, isso não é o caminho! Precisamos de fazer renascer o investimento no país e dar um empurrão à economia, ser mais justos na distribuição de bens e pensar que modelo social seguir. Precisamos urgentemente de mudar, ou não conseguiremos pagar o que devemos. Mas cuidado, precisamos além disso de impor os nossos interesses com as nossas armas. Não esqueçamos que quem nos pede dinheiro também já nos deveu e foram perdoadas dividas enormes à própria Alemanha. É preciso cuidado com esta Alemanha...E esse tal remédio de cortes... pode vir a ser o nosso veneno!

terça-feira, abril 09, 2013

A Rapariga dos Cabelos Castanhos: Sonho


Times Like These

Tem sido bom definir os temas por músicas, e não só pelo nome do texto. É mais... expressivo.
E que tal a história, não? Tu que estás aí desse lado, já deves pensar que vou contar mais uma história de choro ou felicidade que termina da mesma maneira sobre a rapariga dos cabelos castanhos. Pois não se enganam muito, mas talvez esta seja diferente. É melhor é passar à acção talvez.
Bem vamos começar por outro ponto...


Primeiro é preciso dizer que foi difícil. Não foi logo a primeira, não foi logo à primeira, precisei de tempo, de espaço, de ganhar batalhas. Precisei de ser melhor, fortalecer quem sou, ser forte psicologicamente... Só queria ser eu com as capacidades melhoradas, pronto para fazer alguém feliz.
É claro que esse dia veio! Mas não podemos baixar braços ou a cabeça, nem ficar a chorar dias a fio, a pensar na sorte que não tenho ou naquilo que me falta para ser melhor. Prefiro sorrir, mesmo que o meu sorriso seja triste, eu ganho mais do que cair por terra.
ELA foi uma batalha constante!
 Bah, deprimente não? Eu prometi a história, e por isso aqui vai:



- Pssst...
A rapariga dos cabelos castanhos sorria.
- Tive um sonho.
Curioso como sempre, trepei do beliche para a cama que estava superior.
- Na cama do nosso filho? Deve ser do colchão.
- Não sejas tonto, adormeci aqui...
Sorri. Sei porque adormecera. Peço desculpa, não vos situei na história, porque isto fora meses antes do falecimento dela, por aquele cancro fatal e revoltante que lhe ceifou a vida. Os tratamentos do cancro já estavam a avançar e sabia que de dia para dia se sentia cansada. Adormecera ali a fazer a cama do pequeno, que estava com a avó.
- Então meu anjo, conta lá o teu sonho.
Devolveu-me o sorriso.
- Sonhei que tinha voltado.
Complexo? Estava a falar de quê? Já não estava a perceber... Só, se...
- O que queres dizer com...
Sorriu-me.
- A morte sim. Voltei da morte. Voltei como uma espécie de anjo. Não vos podia tocar é certo, mas podia olha por você e ver-vos. Estavam tão bonitos os nossos filhos...
- Isso não vai acontecer... Tu sabes que não... Não deixarei que isso aconteça... Não quero que vás!!!
- Eu tenho esperança que não, mas consegui conformar-me em parte. Pelo menos aprendi a sorrir.
Estava a chorar como uma criança, abandonada pela sua progenitora no meio da selva, como se ninguém me pudesse salvar. E ela abraçou-me...
- Tem calma. Tens de ser forte, como sei que és e cuidar deles. Fiquei feliz por vos ter visto tão bem, e espero que assim seja e mesmo que não volte que cumpras isso bem!
- Tu não vais...
- Aceita que posso ir pequenino...
- E Deus? Viste-o?
Pausa.
- Não. Mas que mais importa quando o amor que nutro por vocês não pode ser posto em causa por qualquer Deus?
- Sabes que não acredito em tudo o que diz a Biblia... Mas não consigo entender a forma como regressas-te...
- Eu também não, mas isso encheu-me de força e fé para acreditar em algo de bom, mesmo que isto seja só um sonho...
Não aguentava ouvi-la a convencer-se e a entregar-se. Não aguentava vê-la sem cabelo, a sofrer e a lutar como nenhuma outra pessoa. Não aguentava mais isto, os nossos filhos sem perceberem exactamente o que a mãe tinha... Chorei muito nesse dia, mais do que no dia em que ela desceu à terra...
- Não chores. Vou estar aqui - apontando para o coração - e tu vais ser feliz com eles, e mesmo que encontrares alguém, será honrada e a mulher para ti. Aprende a sorrir quando os outros choram e recorda coisas boas... acredita nas pessoas.
- Sabes que não deixarei ninguém entrar na minha vida...
- Sei que tu saberás o que fazer, mas fico feliz por ouvir isso.
Silêncio.
- Às vezes pondero em abrir mão de tudo para...
- Não!! Isso não. Tu és forte, e vais aguentar. Os pequenos precisam de ti e tu deles. Sei que serão tão brilhantes como o pai. Sei que serão a pessoa que eu conheci!
O meu choro cessou e pude sorrir:
- Serão pelo menos corajosos e bonitos como a mãe.
E sorri.

sexta-feira, abril 05, 2013

Crónicas da Rapariga dos Cabelos Castanhos: O Sumo da Eternidade


Everlong.

Fins de Julho, uma noite muito quente, quase insuportável, onde dominava no ar o cheiro intenso a fumo e sobre o céu um clarão enorme era visto a muitos kms de distância. Mais uma vez os fogos atacavam o país, um fenómeno repetido, verão após verão.
Passavam vinte minutos das três da manhã e a rapariga dos cabelos castanhos não estava já na cama, embora eu não a tivesse sentido levantar-se. É então que ouço um soluçar da varanda junto com um choro miudinho que entra pela porta entreaberta para poder circular algum ar naquela noite quente. Paciente, não quis interromper. Não queria que ela soubesse que aquele choro também podia ser meu, e então deixei-a.
- Estás acordado? - perguntou-me dirigindo-se para a cama.
- Sim, estou.
Abraçou-se com força e rolou lágrimas sobre a cama. Estava de novo a meditar no passado, a ler os velhos textos que escreveu na sua vida e a tentar reconfortar a alma. Era outra vez a perda, a nossa perda...
Deixei-a soltar tudo, falar e gritar o que pode. A morte é uma convivência difícil, mas também a rapariga dos cabelos castanhos tinha passado por muito mais que isso e eu sabia como se aguentava perante os outros e onde chorava nestes momentos.
- Hey, princesa.
O choro tinha acalmado.
- Diz.
- Alguma vez comeste uma salada de frutas?
Estranhou.
- Sim, comi. Mas porquê?
- Bem...
"Primeiro, olhas para a salada, para a taça. É de vidro, é quebrável se não tomarmos alguma atenção, embora não digo que ela se parta logo da primeira vez que cair. Há pessoas que tentam comprar taças mais resistentes, mas sabemos bem que elas podem partir primeiro do que uma simples taça barata. Depois vais preencher com duas grandes coisas: a fruta e o sumo. A fruta são as coisas mais importantes: pessoas e bens. O sumo preenche o que falta: são as pequenas coisas. De que vale ter muito sumo se depois não temos espaço para a fruta? Nada. Depois, acabamos por ter frutas melhores que outras, podemos mesmo apanhar fruta podre, ou pisada. Algumas vão mesmo acabar por sair rápido, e normalmente comes primeiro as que menos gostas, porque queres ficar com o sabor das ultimas no paladar. É por isso que algumas nunca vão sair do teu gosto, mesmo que desapareçam. Mas há algumas que vão ficar dentro da taça, não que não gostes delas ou por alguma razão parecida, mas sim porque não queres que desapareçam e essas nunca vão sair porque tu já conheces o seu gosto de cor. E por último, não te esqueças de por açúcar, porque uma vida com mais ou menos és tu que controlas, mesmo que a fruta seja má ou não tenhas dinheiro para uma taça melhor, o açúcar é a mínima parte que controlas e isso vai influenciar especialmente o sumo, as pequenas coisas. E mesmo que tudo isto seja mau, ou não estejas feliz, vais ver que haverá mais sabores a descobrir e que vais acabar por levar um sorriso para a rua, mesmo quando tudo parece mau. Porque mesmo que tudo desapareça vai ficar sempre o gosto das coisas. E serás feliz".
Mas o sono parecia que não vinha... porque muitas vezes é mais fácil fazer alguém acreditar nas palavras que nós próprios. Mas há sempre um sorriso nos lábios por aí.
E a rapariga dos cabelos castanhos adormeceu, sem soluços e com o pensamento limpo, tranquila, como a menina pequena que conheci. E eu sorri, porque pacientemente iria ganhar uma guerra secreta.
E o clarão tinha sido dissolvido na noite, estava o incêndio apagado.