sexta-feira, julho 22, 2011

De que cor sao feitos os sonhos?

O reflexo do lago faz-me confusao nos olhos e os pedaços de sal bailam-me sobre a vista. Sobre o lago, a imagem da rapariga dos cabelos castanhos faz-me regressar ao passado e os grossos pingos rolam pelo meu rosto de incompreensao e frustraçao. Nao queria nada discutir com ela, mas foi mais forte e as duvidas levaram-no a essa calamidade.
- Nao tens que ficar assim.
Quem falaria? Nao era possivel que ela o tenha seguido. As raparigas eram orgulhosas, raramente nos perseguem (talvez aquelas que nao tem um palmo de testa), mas sobretudo o facto de ela me ver chorar tornou-me mais embaraçado. Ela porem nao pareceu estranhar, pois os "homens nao choram". Mentiras, e claro que a rapariga dos cabelos castanhos nao acreditava nisso e ela propria tinha ido atras de mim. Se ainda nao acreditava que ela era diferente ai estava uma prova, e isso fez com que eu ainda me encolhesse mais.
- Mas... nao compreendo... Porque e que aquele tipo te obrigou a dar dinheiro? Porque e que tu aceitas-te sem mais nem menos?
- Ele e um cobrador. O meu pai devia-lhe.
Agora fazia mais sentido. Mas porque e que ela nao tinha dito isso mais cedo?
- Nao te disse porque como sabes ele morreu e... bem o meu pai morreu porque apanhou uma infecçao.
Infecçao? Que seria aquilo?
- O meu pai morreu de Sindrome de Imunodeficiencia Adquirida, aquilo a que tu e muitos chamam SIDA. Ele... ele...injectava-se... eu tinha treze anos... e eu... eu tentei... eu juro que tentei... mas ja era tarde... ele ja ha muito que estava fragilizado... eu juro que tentei... eu juro!
Finalmente o castelo desmoronou-se e as verdadeiras razoes da rapariga dos cabelos castanhos eram mais fortes e eu merecedor dessa confiança quando tinha questionado e chateado por uma ninharia, por um problema que era tao mais grave para ela e me deixava numa posiçao desconfortavel. Abracei-a mais uma vez porque ja se vira que os abraços sao o reconforto de uma alma angustiada e beijei-a. Senti nela um tremer, um gosto a sal misturado com o perfume que ela propria continha e mais que um beijo foi a certeza que ali estava. Ela precisava de tudo, e eu queria fazer tudo por ela.
- Eu... eu...
- Tu nao sabias, nem tinhas dever nenhum de o saber. Agora sabes porque es a pessoa em quem mais confio. E se um dia os meus sonhos premitirem quero que fiques comigo.
Era forte, tal como o monte que esculpia uma das margens do Lago Como, e nesse momento me parecia bem mais facil de trepar de que os problemas. Eu queria trabalhar, queria fazer alguma coisa para ajudar a rapariga dos cabelos castanhos, a minha rapariga dos cabelos castanhos, porque eu sabia que apenas podia ser minha, se o mundo tinha-me dado tao grande dadiva como alguem assim. Eu sabia que era o momento e nada mais fazia sentido do que ajuda-la.
- Nunca te abandonarei.
A palavra era certa e a noite tratou de a consolidar, de novo junto daquele lago tao unico como ela, a rapariga dos cabelos castanhos que agora apenas pertencia a mim. Tinha a certeza agora que ia dar tudo por tudo por ela e para a ajudar. Ela merecia mais do que a vida lhe dava, do empenho que cuidava dos irmaos, do afinco que trabalhava...
- Um dia vou saber de que cor sao feitos os teus sonhos
- Tenho a certeza que descobriras.
E sorriu.

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